Banco Master e sua Indecente Relação com o STF

Enquanto o Banco Master desmoronava, ministros do STF e suas famílias recebiam milhões do banqueiro investigado, entre jatinhos privados e contratos suspeitos. Um retrato da impunidade na Suprema Corte.

A Gazeta do Povo não poupou palavras: as relações entre ministros do Supremo Tribunal Federal e o Banco Master são "indecentes". E a imprensa nacional, de O Globo à Folha de S. Paulo, tem exposto nos últimos dias uma teia de conexões que, mesmo aos olhos mais generosos, dificilmente pode ser classificada como outra coisa senão promiscuidade institucionalizada. Enquanto o Banco Master desmoronava sob suspeitas de fraude bilionária — a Polícia Federal investiga um rombo de R$ 12 bilhões envolvendo títulos falsos —, seu dono, Daniel Vorcaro, mantinha relações de negócios diretas com as famílias de pelo menos dois ministros do STF. Não são relações distantes ou ocasionais. São contratos milionários, viagens em jatinhos particulares e sigilos convenientes aplicados no momento certo.

O caso mais escandaloso envolve Alexandre de Moraes. O escritório de advocacia de sua esposa, Viviane Barci de Moraes, assinou um contrato com o Banco Master que totalizava R$ 129 milhões ao longo de três anos, com pagamentos mensais de R$ 3,6 milhões. O documento foi encontrado pela Polícia Federal no celular de Daniel Vorcaro durante a Operação Compliance Zero. Segundo as investigações, o contrato previa que o escritório representasse o banco "onde fosse necessário" — uma cláusula genérica que não especificava processos, ações ou serviços concretos. Em outras palavras, era uma carta em branco.

Para contextualizar o absurdo: R$ 3,6 milhões por mês é mais do que a maioria dos escritórios de advocacia de ponta cobra de seus maiores clientes corporativos em um ano inteiro. Não estamos falando de uma multinacional do petróleo ou uma gigante da tecnologia. Estamos falando de um banco médio, investigado por fraudes, que pagava esse valor a um escritório cuja única peculiaridade notável é ter como sócia a esposa de um ministro do STF. E o mais revelador: em consulta ao sistema do STF, não foram identificados processos nos quais Viviane Barci defendesse o Banco Master. Ou seja, ela receberia milhões por mês para, aparentemente, fazer nada. Nada, exceto ser a esposa de Alexandre de Moraes.

(Sugestão de Pausa)

Mensagens internas apreendidas pela PF mostram que os pagamentos ao escritório de Viviane eram tratados como prioridade absoluta dentro do banco, e Vorcaro orientava que os repasses "não podiam deixar de ser feitos em hipótese alguma". Mesmo com o banco à beira do colapso financeiro, mesmo com credores batendo à porta, os R$ 3,6 milhões mensais para a família Moraes eram inegociáveis. Por quê? A resposta parece óbvia para qualquer pessoa com dois neurônios funcionando: não se paga quase R$ 130 milhões por serviços jurídicos. Paga-se por influência, por acesso, por proteção.

A defesa padrão nesses casos é sempre a mesma: "não há provas de irregularidades", "o contrato é legal", "a advogada é competente". Pode até ser que o contrato seja formalmente legal — afinal, quem determina o que é legal no Brasil é o próprio STF. Mas legalidade e moralidade não são sinônimos. Um juiz cujo cônjuge recebe dezenas de milhões de uma empresa investigada não deveria sequer precisar ser lembrado de que isso representa conflito de interesses gritante. Mas no Brasil do Supremo blindado, o óbvio precisa ser dito e repetido, porque a vergonha deixou de ser um freio comportamental.

Se o caso Moraes já seria suficiente para justificar uma CPI, o caso Dias Toffoli é a cereja do bolo. Dias antes de impor sigilo máximo ao processo que envolve o Banco Master no STF, o ministro Toffoli voou para Lima, no Peru, em um jatinho privado para assistir à final da Libertadores. No mesmo avião estava Augusto Arruda Botelho, advogado que defende um dos diretores do Master preso na operação da Polícia Federal. A viagem foi bancada pelo empresário Luiz Oswaldo Pastore, suplente de senador e amigo de Toffoli.

Horas depois do embarque, a defesa de Vorcaro protocolou uma reclamação no STF pedindo que o caso fosse transferido para a Corte. Por "sorteio", o processo caiu nas mãos de Toffoli. Dias depois, o ministro decretou sigilo total nas investigações. Não sigilo parcial, como é comum em inquéritos sensíveis. Sigilo total. Não é possível visualizar informações como iniciais do autor, nomes completos dos advogados ou qualquer movimentação processual, incluindo novas petições e decisões. Apenas os advogados das partes e o gabinete de Toffoli podem acessar o processo. É uma caixa-preta.

(Sugestão de Pausa)

A Folha de S. Paulo foi direta: Toffoli transformou o caso do Banco Master em um "enigma impenetrável". E o jornal tem razão. Qual a justificativa para esse nível de sigilo? Toffoli alega que o caso envolve questões econômicas que podem impactar o mercado financeiro. Mas essa desculpa não se sustenta. O Banco Master já está liquidado. As fraudes já são públicas. A prisão de Vorcaro foi noticiada em todo o país. O que resta esconder, senão as relações promíscuas entre o banqueiro e figuras do poder?

E as coincidências não param por aí. Roberta Maria Rangel, esposa de Toffoli, integrou a sociedade do escritório Warde Advogados em 2021, sendo que hoje Walfrido Warde é um dos defensores de Daniel Vorcaro. Ou seja: a esposa de Toffoli foi sócia do advogado que hoje defende o dono do Banco Master. Toffoli viajou com outro advogado do caso. E Toffoli é o relator do processo sob sigilo total. Se isso não é conflito de interesses, então o conceito simplesmente não existe.

O mais impressionante não é a existência dessas relações — o Brasil já está acostumado com a promiscuidade entre poder político e poder econômico. O mais impressionante é a total ausência de pudor. Ministros viajam em jatinhos de empresários investigados, suas esposas firmam contratos milionários com bancos fraudulentos, e nada acontece. Ninguém é investigado. Ninguém é afastado. Ninguém presta contas.

A Transparência Internacional Brasil resumiu bem: "O Sistema de Justiça brasileiro está virando um grande Gilmarpalooza". A referência é ao ministro Gilmar Mendes, notório por suas relações com escritórios de advocacia e empresários, mas o termo pode ser aplicado a toda a Corte. O STF virou um clube onde ministros e suas famílias enriquecem às custas de suas posições, enquanto o cidadão comum que atrasa um imposto é tratado como criminoso.

O Banco Central demorou anos para liquidar o Master, apesar de sinais claros de irregularidades desde 2022. Por quê? Porque Vorcaro tinha conexões. Ele patrocinava eventos de ministros do STF no exterior. Contratava ex-ministros como consultores — Ricardo Lewandowski, hoje ministro da Justiça, trabalhou para o Master após se aposentar do STF. O aparelho celular de Vorcaro, apreendido pela Polícia Federal, é visto como uma "bomba de fragmentação" capaz de expor relações políticas e trocas de favores que atravessam governo, Centrão e oposição.

(Sugestão de Pausa)

Investigadores já identificaram diálogos com governadores, deputados, senadores, ministros de Estado e membros do Judiciário. O conteúdo integral ainda não foi revelado, mas a expectativa é de que o celular de Vorcaro seja um verdadeiro mapa da corrupção brasileira. E não por acaso, o processo agora está sob sigilo total no gabinete de Toffoli, longe dos olhos do público e da imprensa.

Sob uma perspectiva libertária, o caso do Banco Master é o exemplo perfeito de por que o monopólio estatal da justiça é uma aberração. Quando os juízes são funcionários públicos vitalícios, sem concorrência, sem fiscalização efetiva e sem risco de perder seus cargos, o resultado inevitável é o abuso. O poder sem consequências corrompe sempre. E o STF é a prova mais cristalina disso.

Em um sistema de justiça privado e competitivo, nenhum tribunal poderia se dar ao luxo de ter juízes cujas famílias recebem dezenas de milhões de empresas que têm processos pendentes. Qualquer indício de conflito de interesses seria suficiente para destruir a reputação da instituição e levá-la à falência. Mas no Brasil, onde a justiça é monopólio do estado, o STF não precisa de reputação. Precisa apenas de poder — e ele tem de sobra.

A solução não está em criar mais regras ou códigos de conduta, como alguns ingenuamente propõem. Códigos de conduta só funcionam quando há incentivos para segui-los. E os ministros do STF não têm nenhum incentivo. Eles não podem ser demitidos. Não podem ser processados. Não precisam prestar contas a ninguém. Podem viajar em jatinhos de investigados, podem ter famílias que enriquecem com contratos suspeitos, podem decretar sigilos convenientes — e nada acontece.

A única solução real é a descentralização radical do poder judicial. Enquanto houver um tribunal com poder de última palavra, blindado de fiscalização e imune a consequências, haverá abuso. O estado não precisa de reforma. Precisa de demolição. E o STF é o exemplo mais claro de por quê.

O mais deprimente de tudo é o silêncio da classe política. Onde está o Congresso Nacional? Onde estão os senadores que deveriam estar pedindo explicações? Onde está a CPI? O senador Eduardo Girão mencionou que a CPI do Banco Master está há dois meses no Senado sem sequer ser numerada. Parlamentares têm medo de enfrentar o STF. Sabem que, se desafiarem a Corte, podem ter suas vidas e carreiras destruídas por inquéritos arbitrários, processos kafkianos e decisões monocráticas.

(Sugestão de Pausa)

O STF sequestrou a república. E o fez com a cumplicidade covarde de todos os outros atores institucionais. Enquanto o Congresso se omitir, enquanto a imprensa continuar tratando ministros como celebridades intocáveis, enquanto o cidadão aceitar passivamente que seus impostos financiem esse teatro de horrores, nada mudará.

O caso do Banco Master não é uma aberração. É o retrato fiel do sistema. É o Brasil profundo, onde a lei existe para proteger os poderosos e oprimir os fracos. Onde a justiça é mercadoria vendida ao melhor lance. Onde ministros se vendem por contratos milionários e depois têm a audácia de se apresentarem como guardiões da democracia.

A Gazeta do Povo chamou essas relações de indecentes. Mas indecência é eufemismo. O termo correto é corrupção. E enquanto o STF puder julgar em causa própria, enquanto puder blindar seus próprios escândalos com sigilos e canetadas, o Brasil continuará sendo refém de uma elite togada que transformou a Corte Suprema em um balcão de negócios. O Master quebrou. Mas a lição permanece: no Brasil, quem tem conexões no STF não precisa ter dinheiro no banco. Basta ter influência na toga.

Referências:

https://www.gazetadopovo.com.br/rodrigo-constantino/banco-master-escritorio-esposa-alexandre-moraes-129-milhoes/
https://oglobo.globo.com/blogs/malu-gaspar/post/2025/12/conexoes-de-ministros-com-caso-master-desgastam-stf.ghtml
https://www.gazetadopovo.com.br/republica/toffoli-viagem-advogado-banco-master/
https://www.gazetadopovo.com.br/economia/caso-master-mostra-forca-do-lobby-e-de-articulacoes-politicas-em-brasilia/