Preço do OVO DE PÁSCOA dispara e ultrapassa os R$ 400, mas de quem é a culpa?

A alta de preços no Brasil está tão descontrolada, que um lançamento da Páscoa de 2024 se tornou, na prática, um artigo de luxo.

Um novo sabor de ovo de páscoa se tornou uma sensação no Brasil, nas últimas semanas. Trata-se da versão oval do controverso Caribe, da Garoto - que é um exemplar legítimo de bombom que pode ser classificado como “ame ou odeie”. Para algumas pessoas, ele está fadado a ser o último bombom da caixa - por conta de seu sabor, digamos, exótico e bananesco. Para outras pessoas, ele é o melhor de todos - e pelo mesmo motivo. Existem relatos, inclusive, de pessoas chegando as vias de fato, na disputa pelo único Caribe disponível na caixa de bombons da citada Garoto.

A defesa intransigente desse bombom, por parte de seus fãs mais aguerridos, fez com que a fabricante tivesse a inusitada ideia de fazer a versão ovo de páscoa do Caribe. Capitalismo, meus amigos! E o pior é que a coisa deu certo - tão certo que, poucas semanas após seu lançamento, o ovo de páscoa Caribe simplesmente desapareceu da maior parte das lojas. A Garoto, por sua vez, celebrou o sucesso, mas avisou que não vai mais fabricar esse produto - pelo menos nesta Páscoa.

Por conta dessa extrema procura, muitos espertinhos tiveram a ideia - ainda mais brilhante - de comprar os ovos Caribe, para revendê-los, num preço mais elevado. Sim, meu amigo: são os cambistas do chocolate. Assim, começaram a surgir anúncios que acabaram viralizando nas redes sociais, e nos sites de notícias - alguns dos quais oferecendo o cobiçado produto por valores superiores a R$ 400. Sim: 400 mangos, por um ovo de páscoa bastante simples, fabricado pela Garoto - que está longe de ser uma chocolateria de ponta. A título de comparação: parece que esses ovos Caribe chegaram às prateleiras custando R$ 50. Isso que chamo de valorização!

Só por aí, esse caso já abre um leque para um debate a respeito de uma série de temas econômicos. Em primeiro lugar, precisamos falar de uma verdade ensinada há mais de um século e meio pelo economista Carl Menger, mas que é tristemente esquecida por toda parte - a de que o valor é subjetivo. Veja bem: um ovo de páscoa é feito com o uso de chocolate e outros insumos - desde seu preparo, até sua embalagem. Agora, para deixar a coisa mais evidente, vamos usar o exemplo desses ovos que replicam sabores de bombons já consolidados, em seu formato normal.

É fácil perceber como os ovos custam muito mais caro - se fizermos um cálculo por grama ou quilo. Por exemplo: você consegue encontrar, se procurar bem, um ovo Ferrero Rocher, de 365g, sendo vendido por uns R$ 120. Isso dá um valor total de R$ 328 por quilo desse chocolate. Só que, com o preço de um desses ovos, você poderia comprar 4 caixas de bombons dessa mesma marca - totalizando 600g, quase o dobro, em 48 bombons.

Agora, se formos comparar o ovo de páscoa Caribe, aí a coisa nem tem mais graça! Esse modelo viral pesa 229g e, como vimos, chega a ser vendido por mais de R$ 400. Em comparação, você pode comprar uma caixa com 30 unidades de Caribe (o bombom), num total de 840g, por R$ 60. Ou seja: no fim das contas, nós pagamos por marcas, sensações e sentimentos, e não por insumos e pelo custo da mão-de-obra empregada. Em resumo: o valor é sempre subjetivo.

Um segundo ponto econômico a ser analisado é a própria lei da oferta e da demanda - e o preço atualmente praticado, para esse ovo de páscoa, demonstra isso de forma inequívoca. Quando muita gente demanda um item escasso, seu preço vai às alturas. É bem provável que, no próximo ano, e dado o sucesso observado, a Garoto ofereça uma quantidade maior de ovos Caribe, a fim de estabilizar a relação oferta x demanda. Enquanto isso não acontece, o próprio mercado se encarrega de corrigir esse excesso de demanda. Os preços, de forma natural, subiram consideravelmente. Portanto, quem quer mais, paga mais. Quem não quer tanto assim, deixa essa oportunidade passar.

A verdade, contudo, é que o preço do chocolate está subindo, de forma geral - e não apenas naqueles sabores recheados com banana. Isso pode ser explicado, de forma simples, pelo brutal aumento no preço mundial do cacau - que é produzido, majoritariamente, na África; especialmente, na Costa do Marfim. Por lá, as já precárias estruturas foram pioradas por conta do fenômeno El Ninõ, que provocou severas quebras de safra.

Assim, e por incrível que pareça, o cacau se tornou a commodity do momento. Nos últimos meses, a valorização do cacau superou a do Bitcoin - acredite ou não! O seu preço praticamente dobrou, apenas neste ano de 2024. O pior de tudo é que esse cenário não tem previsão de melhora - pelo menos no curto prazo. É bem provável, portanto, que o Natal também traga preços salgados para os doces de chocolate.

Por conta desse cenário, o preço do chocolate, em geral, disparou consideravelmente nos últimos meses. E, agora, por ocasião da Páscoa, o preço dos ovos se tornou ridículo. É cada vez mais comum vermos cenas de promoções com ovos de páscoa sendo parcelados em até 10 vezes no cartão! Por sinal, isso já vinha acontecendo, com outro produto bastante afetado pelas condições climáticas - o azeite. Aliás, se você procurar direitinho, é bem provável que você acabe encontrando promoções que oferecem a possibilidade de comprar ovos de páscoa, usando o saque aniversário do FGTS.

Contudo, de forma geral, esse problema relacionado ao fornecimento da matéria-prima - o cacau - tende a ser sazonal, temporário. Em algum momento, as plantações serão restabelecidas, e o fornecimento de cacau, nas antigas condições, fará com que o preço internacional seja corrigido para baixo. Ainda assim, os chocolates no Brasil continuarão a ficar mais caros, e com uma qualidade mais baixa - e isso não por conta do El Niño, mas sim por conta do estado. E o motivo mais óbvio é o avanço da inflação.

Sim, estamos usando aqui, para fins retóricos, a definição estatal para o termo “inflação” - ou seja, aumento de preços, o que é reconhecidamente errado. Como tudo o mais na economia, o preço dos chocolates tem sido corrigido pelo mercado, para refletir o aumento na base monetária do real. E é justamente isso que nos garante que, quando o preço do cacau voltar aos antigos patamares, os chocolates comercializados no Brasil estarão mais caros do que antes dessa escassez toda começar.

Só que, nesse caso, existe outro fenômeno muito interessante, e que pode ser classificado como outra manifestação do problema inflacionário. Esse fenômeno é conhecido, em português, como “reduflação”. Nós, inclusive, já falamos sobre isso no vídeo: “O FENÔMENO que DIMINUI os PRODUTOS, sem diminuir seus PREÇOS” - link na descrição. Basicamente, ao invés de vermos o preço de um produto aumentar, vemos seu tamanho ser reduzido, ou sua qualidade ser depreciada.

Pense que, em finais dos anos 1980, as barras de chocolate comercializadas no Brasil tinham um peso de 200g. Ao longo de mais de 30 anos, esse valor foi caindo, de forma sucessiva, até chegar aos atuais 80g - peso adotado por algumas marcas. Sim: a barra de chocolate está 3 vezes menor hoje do que 3 décadas atrás. Só que essa redução não se restringe apenas ao tamanho dos produtos.

Se você é um apreciador de chocolate, você certamente já percebeu que as barras, os ovos e os bombons estão cada vez mais doces, não é mesmo? A explicação para esse fenômeno é muito simples: o açúcar é muito mais barato que os derivados do cacau. Por isso, para evitar aumentar os preços, os produtores preferem entupir a fórmula dos chocolates de açúcar e de gordura hidrogenada (também mais barata). Isso, além de reduzir a qualidade do produto, também faz com que o brasileiro tenha um paladar cada vez mais infantil. Agora, você precisa pagar mais caro num chocolate "dark", para se aproximar do sabor que o chocolate tinha há pouco tempo atrás.

E ainda há outro fator que colabora bastante para o aumento dos preços do chocolate no Brasil: a alta carga tributária. Sim, esses produtos são pesadamente tributados por aqui - em cerca de 40% do seu valor. Só que a coisa não para por aí! Sabe o imposto seletivo, também chamado de “imposto de pecado”, e que está previsto na nova reforma tributária? Pois é: os chocolates também estão na mira dos legisladores. Ou seja: esses produtos vão ser ainda mais tributados. Você sabe, os chocolates fazem mal para a saúde, então você não deve comê-los… mais uma vez, é o governo preocupado apenas com o seu bem!

Conforme já adiantamos, o atual cenário do cacau com preços absurdamente altos vai ser corrigido em algum momento. As condições climáticas vão se restabelecer, as safras vão voltar aos antigos patamares - nada de novo no front. Além disso, o próprio mercado pode resolver essa escassez de oferta, porque os altos preços se mostram extremamente atraentes para novos produtores. Se houver liberdade, a sociedade é capaz de resolver os seus próprios problemas, de forma inteligente e eficiente.

Contudo, aqui no Brasil, podemos ter a certeza de que, quando o preço mundial do cacau se estabilizar em seus antigos patamares, ainda assim o nosso chocolate vai estar mais caro do que no passado. Afinal de contas, quando você compra um ovo de chocolate, uma das bandas fica para você, e a outra para o governo - através dos impostos. E não apenas isso: em alguns anos, sua barra de chocolates terá o tamanho de um BIS, e um gosto de rapadura. Por isso, nesta Páscoa, enquanto você estiver se lamentando por ter gastado uma grana preta para comprar um ovo da Cacau Show para comer em família, lembre-se de quem é o verdadeiro culpado nessa história.

Referências:

https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2024/03/22/bombons-e-barras-de-chocolate-ficam-mais-caros-na-pascoa-2024-diz-estudo.htm

https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2024/03/23/ovo-de-pascoa-em-10-parcelas-nao-e-so-no-brasil-veja-o-culpado-da-alta-do-chocolate-no-mundo-que-vai-continuar.ghtml?utm_source=dlvr.it&utm_medium=twitter

Variação no preço do Cacau x BTC:
https://twitter.com/livecoinsBR/status/1771970027563930016/photo/1

Reduflação do Chocolate:
https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/negocios/de-200g-a-80g-por-que-a-barra-de-chocolate-encolheu-ao-longo-do-tempo-1.3293586

Tributação sobre o Chocolate:
https://arieloliveira.com.br/2023/04/05/quais-sao-os-tributos-incidentes-dos-produtos-mais-vendidos-na-pascoa/

Imposto do pecado:
https://veja.abril.com.br/economia/os-produtos-na-mira-do-futuro-imposto-do-pecado-no-governo-lula

“O FENÔMENO que DIMINUI os PRODUTOS, sem diminuir seus PREÇOS”:
https://www.youtube.com/watch?v=7PXMxD2ORjo