Uma agente de trânsito presa ao tentar vender uma moto apreendida revela, em escala reduzida, o verdadeiro funcionamento do estado: roubo legalizado com discurso de moralidade.
Na cidade de Parauapebas, no Pará, uma agente de trânsito foi presa em flagrante após tentar vender uma motocicleta apreendida durante uma blitz. O caso, ocorrido no dia 21 de outubro, ganhou repercussão nacional quando o dono do veículo, ao tentar regularizar sua situação, descobriu que sua moto simplesmente havia “sumido” do pátio do Departamento Municipal de Trânsito e Transportes (DMTT).
Desesperado e desconfiado, o homem acabou encontrando o próprio veículo sendo anunciado por R$ 7,5 mil no Marketplace do Facebook. Fingindo interesse na compra, ele marcou um encontro com a vendedora — que, para surpresa geral, era justamente a agente que havia apreendido a moto. A servidora foi afastada e a Secretaria de Trânsito abriu um processo administrativo disciplinar para “preservar a imagem do órgão”.
A história parece saída de um episódio de South Park, mas infelizmente não é uma exceção. É apenas mais um retrato fiel de como o estado realmente funciona: uma estrutura que concentra poder coercitivo nas mãos de pessoas comuns, sob o disfarce de “autoridade”. E como diria Frédéric Bastiat, famoso filósofo e economista francês do século 19, o estado é “a grande ficção através da qual todos tentam viver à custa de todos os outros”.
O caso de Parauapebas não é sobre uma servidora corrupta. É sobre um sistema inteiro construído sobre o princípio da coerção e da apropriação forçada do que pertence aos outros. A moto que Luciene tentou vender foi “apreendida” — um termo burocrático que esconde o que, em qualquer outro contexto, seria chamado de roubo.
O dono do veículo, muito provavelmente, não havia cometido nenhum crime contra outra pessoa. Talvez estivesse com o IPVA atrasado, com o documento vencido ou sem o capacete exigido por lei. E, por isso, o estado se sentiu autorizado a confiscar seu bem. É o mesmo raciocínio feudal de séculos atrás: o servo devia pagar tributo ao senhor para ter o direito de existir dentro de suas terras. Mudaram os uniformes, os selos e os crachás — mas o princípio continua o mesmo.
Esse tipo de abuso é cotidiano. Em São Paulo, guardas municipais já foram acusados de roubar mercadorias apreendidas de ambulantes. No Rio, agentes de fiscalização cobram propina para liberar veículos irregulares — esquemas tão corriqueiros que se tornaram parte do custo de quem trabalha no transporte autônomo.
A imprensa chama tudo isso de “corrupção”, “má conduta” ou “desvio de função”. Mas o problema é mais profundo: essas pessoas não agem contra o espírito do estado — agem em plena harmonia com ele.
Elas apenas aplicam em escala pessoal o mesmo modelo de exploração que o estado pratica em escala institucional. A diferença é que, quando o político ou o órgão faz o mesmo, o nome muda: chama-se “tributo”, “multa”, “tarifa pública” ou “execução fiscal”.
O estado vive de se apropriar do trabalho e da propriedade alheia. Quando um burocrata o faz sem autorização hierárquica, vira crime; quando o faz com carimbo oficial, vira política pública. É a hipocrisia institucionalizada. Bastiat já alertava: “Quando o saque se torna uma forma de vida para um grupo de homens, eles criam para si um sistema legal que o autoriza e um código moral que o glorifica.”
Quando um policial toma seu carro porque você não pagou um imposto, isso não é diferente de um mafioso cobrando “proteção” em troca de não quebrar sua loja. A diferença é que o mafioso, ao menos, não finge estar te protegendo “pelo bem comum”. Esse caso é a miniatura perfeita do funcionamento de instituições muito maiores. Quando a Receita Federal confisca o salário de alguém por dívida tributária, ela está fazendo exatamente o que Luciene tentou fazer: apropriar-se do trabalho alheio sem consentimento. Quando o Judiciário bloqueia contas bancárias de quem não paga imposto, está exercendo o mesmo poder arbitrário, só que em escala nacional. E quando o governo leiloa bens “apreendidos” de cidadãos, está repetindo o mesmo ato que levou Luciene à cadeia — a diferença é que o ladrão, nesse caso, usa terno e ganha foro privilegiado.
A agente de Parauapebas apenas deu um pequeno passo além do que o próprio sistema já faz oficialmente. Ela roubou algo que o estado havia roubado antes. A máfia estatal se escandaliza quando um de seus membros decide agir fora da hierarquia e tirar vantagem pessoal, mas o mecanismo é o mesmo: apropriação coercitiva de bens sob a desculpa de “cumprir a lei”.
O estado se escandaliza com seus pequenos ladrões porque teme a concorrência. A máfia estatal não aceita que um de seus capangas atue por conta própria. É preciso obedecer à cadeia de comando. O erro de Luciene, para o estado, não foi o roubo, mas a falta de burocracia para torná-lo “legal”.
A legalidade, portanto, se transforma em disfarce para a imoralidade. A escravidão foi “legal”, o nazismo foi “legal”, o confisco de propriedades em regimes socialistas é “legal”. A moralidade não vem da caneta do legislador, mas do respeito ao princípio da não agressão — algo que o estado, por natureza, não pode cumprir.
A diferença entre o estado e o mafioso é apenas que o estado se justifica dizendo fazer isso pelo bem comum. Mas o que é o “bem comum”? Murray Rothbard já dizia que ele não existe: existem apenas indivíduos com seus próprios interesses, e qualquer tentativa de impor um “bem coletivo” inevitavelmente beneficia quem detém o poder. Para o político, o bem comum é o voto e o controle; para o burocrata, é o salário garantido e a aposentadoria integral; para o cidadão produtivo, o “bem comum” é só o peso de sustentar todos os outros.
Em qualquer relação entre indivíduos livres, a troca só acontece quando ambas as partes consentem. Mas no sistema estatal, o consentimento desaparece — o cidadão é coagido a obedecer, pagar e se submeter. E onde há coerção, sempre haverá abuso.
A corrupção não é um acidente — é o produto natural de um sistema que concede poder sem consentimento. O estado cria o terreno ideal para o crime porque concede a alguns o direito de fazer o que, para todos os outros, é proibido. A agente Luciene só teve oportunidade de roubar a moto porque o estado lhe deu poder sobre o outro. Nenhum cidadão comum pode sair confiscando o bem de outro. Mas um agente público pode — e o faz com total respaldo da lei estatal. Se não existisse blitz, apreensão e monopólio da força, Luciene não teria o que vender. O problema não é só a “moralidade individual” dela, mas o sistema que cria incentivos para o abuso. A “corrupção” foi apenas o fruto lógico de um privilégio concedido por lei. E enquanto existirem privilégios, existirão Lucienes — com crachás diferentes, mas com o mesmo instinto.
O comunicado oficial do DMTT de Parauapebas, por sua vez, é outro esculacho ao cidadão. A nota afirma que o afastamento da agente é necessário para “preservar a imagem do órgão”. Nada sobre ressarcir o dono da moto, nada sobre repensar o sistema que permite tal abuso. A preocupação é estética — manter as aparências. É o mesmo raciocínio de políticos flagrados em corrupção: o problema não é o roubo, mas ter sido pego.
A estrutura estatal é feita para proteger a própria máquina, não o cidadão. Quando um escândalo estoura, abre-se um PAD, cria-se uma comissão, redige-se uma portaria. Tudo para manter a ilusão de que “o sistema está funcionando”. Mas o que chamam de “falha” é, na verdade, o funcionamento normal do estado.
Os estatistas gostam de dizer que, sem o estado, viveríamos no caos. Mas o que é esse sistema, senão o próprio caos institucionalizado? Vivemos sob uma estrutura que toma, proíbe e pune, e ainda se autoproclama guardiã da moral. O cidadão não pode escolher outro prestador de “serviços públicos”; não pode romper contrato; não pode deixar de pagar. É refém de um monopólio absoluto, legitimado pela força.
Imagine uma empresa privada que pudesse te cobrar à força, confiscar seus bens e te prender se você não pagasse. Todos a chamariam de máfia. Mas quando o mesmo grupo imprime uma bandeira e escreve uma Constituição, passa a ser chamado de “governo”.
O problema do poder estatal não é quem o exerce, mas o fato de existir. Nenhum “governo dos melhores” resolverá o dilema moral de uma instituição fundada na coerção. O erro está na estrutura. A corrupção não é um desvio: é a lógica do sistema levada às últimas consequências. Por isso, não há reforma que cure, não há “fiscalização” que resolva. Dar mais poder à máquina estatal para combater abusos é como dar mais bebida a um alcoólatra para que ele “pare de beber”.
Por isso, a solução não está em “melhorar o estado”, “moralizar o serviço público” ou “reforçar a fiscalização”. Essas medidas apenas dão mais poder à máfia. A única forma de impedir o abuso é eliminar o poder coercitivo. Em uma sociedade livre, as regras surgem de contratos voluntários, de associações privadas, de concorrência. Se uma empresa de segurança abusa, perde clientes. Se um tribunal privado erra, perde credibilidade. Ninguém é obrigado a sustentar o sistema que o oprime. Já no estado, o cidadão paga até para ser roubado. Financia o salário de quem o multa, o bônus de quem o fiscaliza e a aposentadoria de quem o condena. É o cúmulo da ironia: o assaltado bancando o salário do ladrão.
O caso de Luciene é apenas um entre milhares. Ele não é uma aberração — é o espelho em miniatura do funcionamento estatal. A agente de Parauapebas foi apenas mais honesta na forma: roubou sem disfarce, sem carimbo, sem licitação. A diferença é que o crime dela não passou pelo ritual burocrático do “leilão público”.
O Estado é o inimigo natural da sociedade civil. Ele não existe para proteger ninguém, mas para controlar, explorar e manter dependência. Enquanto o cidadão for tratado como súdito e o servidor como dono, nada mudará. O primeiro passo para mudar esta realidade é entender que não há diferenças concretas entre o Estado e as máfias e gangues comuns, exceto de escala e de fingimento de legalidade.
Enquanto as pessoas acreditarem que o Estado “serve ao povo”, continuarão vítimas do golpe que é esta instituição de assalto legalizado. Luciene foi presa por vender uma moto "apreendida". Mas, no fundo, ela só repetiu — em escala menor e mais explícita — o que o próprio Estado faz todos os dias: rouba, lucra e chama isso de justiça.
https://noticias.r7.com/para/balanco-geral-para/agente-de-transito-e-detida-por-tentar-vender-moto-apreendida-em-parauapebas-pa-22102025/
https://www.gutenberg.org/files/44800/44800-h/44800-h.htm
https://history.hanover.edu/courses/excerpts/165acton.html
https://g1.globo.com/sp/sao-carlos-regiao/noticia/2020/02/10/ambulante-faz-bo-contra-a-gcm-apos-ter-mercadoria-apreendia-e-so-recuperar-parte-dos-produtos.ghtml
https://www.youtube.com/watch?v=-8okAR67M1M