Dossiê Ambipar: A Ciranda do Caixa Fantasma

Uma trama digna de novela: entenda a conexão com o Banco Master, a denúncia do ex-CFO e o fim da gigante ESG.

A crise da Ambipar, que culminou na revelação de um caixa fantasma em um controverso FIDC "Crédito Verde" administrado pelo Banco Master, é a crônica de como uma das principais empresas da "onda ESG" ruiu sob o peso de suas próprias decisões.

Desde seu IPO em 2020, a Ambipar protagonizou uma das trajetórias mais meteóricas do mercado de capitais brasileiro. Rapidamente, tornou-se a principal aposta do setor ESG, alimentando uma verdadeira febre entre os investidores e impulsionando uma valorização de 800% em suas ações. Impulsionada por uma visão ambiciosa, a empresa publicou planos de se consolidar como referência global em soluções ambientais.

Sob comando de Tércio, a percepção era que a companhia encarnou o seu estilo. Descrito como vaidoso, é visto como alguém que prefere as coisas do seu jeito, no lugar e na hora que ele escolher. Um folclore desse perfil é que chegou a marcar reuniões simultâneas, com interlocutores de diferentes empresas, num mesmo restaurante, e ficou pulando de mesa em mesa. A estratégia era clara: crescer por aquisições.

Em pouco mais de 2 anos, foram mais de 40 empresas incorporadas, em uma dinâmica voraz de fusões e aquisições. Por trás do frenesi, porém, desenhava-se um risco silencioso. O crescimento acelerado deixou de ser orgânico e passou a ser sustentado quase exclusivamente por dívidas, que atingiram a cifra de R$ 10 bilhões.

A bolha começaria a mostrar sinais de fragilidade quando o ambiente macroeconômico global mudou de direção. O aumento das taxas de juros, usado como ferramenta para conter a escalada inflacionária, pressionou o custo dos financiamentos. Para a Ambipar, o resultado foi devastador: o serviço da dívida tornou-se insustentável, levando a companhia a entrar em uma espiral de “queima de caixa” e acendendo o primeiro sinal amarelo no radar do mercado financeiro.

Com a credibilidade já abalada, o mercado se voltou para os balanços da Ambipar e fez a pergunta que selaria seu destino: "Onde estão os R$ 4,7 bilhões em caixa que a empresa declara?". A resposta, revelada em matérias investigativas, estava em uma complexa peça de engenharia contábil que conectava diretamente a Ambipar ao Banco Master.

A estrutura central era o FIDC "Crédito Verde", um fundo administrado e custodiado pelo Banco Master. A operação funcionava de forma circular: a Ambipar vendia suas contas a receber para este FIDC, sendo ela mesma a principal, senão a única, investidora (cotista) do fundo. Na prática, a Ambipar, com a operação do Banco Master, estava antecipando recebíveis com seu próprio dinheiro.

O problema fundamental, que destruiu a confiança dos credores, foi a Ambipar classificar os R$ 3 bilhões dentro deste FIDC como "caixa disponível". O mercado percebeu que isso não era dinheiro líquido para pagar dívidas, mas sim uma reclassificação de "contas a receber" para parecer "caixa". A crise de credibilidade do próprio Banco Master, que também enfrentava escrutínio no mercado, apenas amplificou a desconfiança sobre essa estrutura, adicionando mais uma camada de risco. A revelação desta "contabilidade criativa" provou aos credores que o caixa reportado era uma miragem.

A desconfiança gerada por essa estrutura contábil foi confirmada da forma mais contundente possível. O ex-CFO Thiago da Costa Silva deixou a Ambipar por discordar frontalmente das práticas impostas pelo controlador, Tércio, principalmente sobre o FIDC e a falta de transparência com o mercado.

Após a sua saída e ciente de sua responsabilidade legal sobre os balanços, ele tomou a drástica atitude de procurar voluntariamente a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) para expor suas preocupações. Este ato de denúncia e autopreservação serviu como a validação final para as teses dos credores. Se o próprio responsável pelas finanças se recusava a endossar os números e sentia a necessidade de alertar o órgão regulador, ficava claro que a crise da Ambipar não era apenas de estratégia, mas também de governança.

O calote que levou à perda da EMAE não foi em uma dívida com o Banco Master, mas com um fundo da gestora JGP. A empresa Phoenix, de Nelson Tanure e ligada a Tércio, não pagou uma parcela de juros de R$ 76 milhões. A crise de falta de caixa real na Ambipar, agora exposta pela descoberta do FIDC, foi o que provavelmente impediu que a dívida particular fosse honrada.

Com o calote, a JGP, representada pela XP Investimentos e a Vórtx, executou a garantia: as ações da EMAE. Os papéis foram tomados e vendidos para a Sabesp. O episódio misturou os problemas corporativos da Ambipar com os negócios privados de seu controlador, aniquilando a pouca confiança que restava.

A soma de todos esses fatores com a dívida corporativa, a contabilidade criativa do FIDC, a denúncia do ex-CFO e o escândalo da EMAE, criou uma tempestade perfeita. O mercado entrou em "modo pânico", as ações da Ambipar viraram pó e o acesso a crédito desapareceu.

O efeito colateral mais trágico foi para o investidor de varejo que havia comprado COEs (Certificados de Operações Estruturadas) atrelados à dívida da Ambipar. Com a derrocada dos títulos da empresa, uma cláusula contratual foi ativada, obrigando as corretoras a liquidarem os COEs a preço de mercado. Como os títulos não valiam quase nada, o prejuízo para os investidores foi devastador, frequentemente superando os 90% do capital aplicado.

O colapso da Ambipar não limitou-se à própria empresa, mas como um vírus financeiro, a crise está se espalhando, contaminando instituições financeiras e se estendendo até a setores não relacionados.

Conforme revelado em matéria do site Seu Dinheiro, o BlueBank, banco digital controlado por Mauricio Quadrado, foi colocado à venda devido à sua forte exposição à Ambipar. O BlueBank atuava como operador do já mencionado FIDC "Crédito Verde", a peça central da maquiagem contábil da Ambipar. A crise de credibilidade da Ambipar tornou a posição do BlueBank insustentável, forçando seu controlador a buscar um comprador como única saída.

O colapso da liquidez tornou-se tão severo que a Ambipar passou a não honrar nem com as suas despesas mais triviais como o aluguel de seus escritórios no Edifício Rio Sul, no Rio de Janeiro, do fundo imobiliário BMLC 11. Portanto se tornaram inadimplentes do fundo imobiliário.

O ato de não pagar o aluguel sinaliza ao mercado que a empresa não tem caixa para as operações mais básicas do dia a dia, tornando a iminente Recuperação Judicial uma mera formalidade.

Até a data desta publicação (outubro de 2025), a Ambipar ainda não formalizou seu pedido de Recuperação Judicial. Contudo, todos os sinais e movimentos da companhia indicam que este é um passo iminente e inevitável.

A empresa obteve na justiça uma medida cautelar, que na prática funciona como um escudo temporário, suspendendo por 30 dias o pagamento de dívidas e a execução por parte de seus credores. Esta é uma manobra legal classicamente utilizada como a antecâmara da Recuperação Judicial, um fôlego final para organizar o processo.

Para o mercado, o veredito já foi dado. O valor de suas ações e títulos de dívida reflete uma empresa cuja capacidade de honrar seus compromissos por conta própria não existe mais. A Recuperação Judicial é questão de tempo.

E para nós libertários fica a lição: o estado que diz proteger os pobres, na verdade cria mecanismos para proteger esses grandes empresários e garantir que suas empresas de fachada quebram, mas seus CPFs saiam com o espólio do que sobrar. Não custa lembrar que o governo Lula fechou em janeiro deste ano 5 contratos no valor de meio bilhão com a Ambipar. Será que o governo não sabia do desastre, ou foi só uma última injeção de dinheiro pra garantir que os bilionários donos da empresa saíssem com mais dinheiro quando a empresa quebrasse? Eu não sei, o que sei é que o bitcoin me protege disso.

Referências:

A Trajetória do Auge à Queda (Folha de S.Paulo): https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2025/10/como-ambipar-foi-de-800-de-valorizacao-acionaria-a-beira-da-recuperacao-judicial.shtml

Análise do Cenário (Barbieri Advogados / Reprodução): https://www.barbieriadvogados.com/como-ambipar-foi-de-800-de-valorizacao-acionaria-a-beira-da-recuperacao-judicial/

O Início da Crise (Jovem Pan): https://jovempan.com.br/programas/jornal-da-manha/crise-da-ambipar-expoe-risco-de-recuperacao-judicial.html
Risco de Insolvência e Ações "Penny Stock" (Investalk BB): https://investalk.bb.com.br/noticias/mercado/ambipar-ambp3-na-berlinda-risco-de-insolvencia-faz-empresa-virar-penny-stock

A Crise de Confiança e as Revelações:
A Revelação do FIDC Misterioso (Pipeline/Valor): https://pipelinevalor.globo.com/negocios/noticia/o-misterioso-fidc-da-ambipar.ghtml
A Denúncia do Ex-CFO à CVM (NeoFeed): https://neofeed.com.br/negocios/por-que-o-ex-cfo-da-ambipar-procurou-a-cvm-e-o-que-tratou-na-conversa/
O Pânico do Mercado e a Pergunta sobre o Caixa (NeoFeed): https://neofeed.com.br/negocios/mercado-entra-em-modo-panico-com-ambipar-e-se-pergunta-onde-esta-o-caixa/

A Trama Paralela (Caso EMAE / Tanure):
A Conexão entre Tanure, Ambipar e EMAE (InvestNews): https://investnews.com.br/negocios/tanure-ambipar-emae/
A Compra da EMAE pela Sabesp (Money Times): https://www.moneytimes.com.br/sabesp-sbsp3-bate-de-frente-com-tanure-em-transacao-para-compra-da-emae-movimento-e-positivo-lmrs/

As Consequências para os Investidores:
Prejuízos nos COEs (InvestNews): https://investnews.com.br/investimentos/investidores-de-coes-da-ambipar-e-da-braskem-tem-prejuizos-de-ate-93/
Reclamação de Cliente sobre COE (Reclame Aqui): https://www.reclameaqui.com.br/xp-investimentos/liquidacao-forcada-de-coe-da-ambipar-pela-xp-e-grande-perda-financeira_jY5JfnmL-5MfC_Vh/

Discussão de Investidores (Reddit): https://www.reddit.com/r/investimentos/comments/1o0gwsd/quem_comprou_coe_da_ambipar_vai_ser_obrigado_a/

Em divida: https://veronoticias.com/economia/ambipar-deixa-de-pagar-aluguel-e-causa-prejuizo-a-fundo-imobiliario/
https://www.seudinheiro.com/2025/empresas/com-forte-exposicao-a-ambipar-ambp3-bluebank-de-mauricio-quadrado-busca-comprador-diz-site/

Informação Corporativa:
Estrutura Acionária (Site de RI da Ambipar): https://ri.ambipar.com/estrutura-acionaria/