Enquanto a violência cresce nas ruas, juízes liberam criminosos e permanecem isolados, blindados e alheios à vida real.
Patrick Rocha Maciel adquiriu sua primeira passagem pela polícia aos 10 anos de idade. Aos 20, já eram 86 passagens. Na sétima vez que foi preso, o juiz Rubens Roberto Rabelo Casara decidiu soltá-lo novamente. Para o magistrado, "a existência de anotações na folha penal não é pressuposto da prisão cautelar" e "não se pode presumir que os acusados retornarão a delinquir". Um jovem com 86 registros criminais, segundo essa lógica judicial, não apresenta indícios de que voltará a cometer crimes.
A decisão ganha contornos ainda mais surreais quando descobrimos que Casara é marido da filósofa Márcia Tiburi — defensora pública da tese de que "assalto é redistribuição de renda". Temos aqui o retrato perfeito da elite judicial brasileira: um casal blindado pela segurança de condomínios fechados e carros oficiais, teorizando sobre criminalidade para quem vive na linha de frente da violência urbana.
A magistratura brasileira criou para si uma aristocracia de privilégios que faria inveja aos nobres do Antigo Regime. Salários de R$ 35 mil mensais, auxílio-moradia, planos de saúde premium, segurança pessoal e 60 dias de férias anuais compõem uma blindagem socioeconômica que os mantém em órbita completamente distinta da realidade brasileira.
O resultado inevitável? Decisões que parecem vindas de outro planeta — ou de outro país.
Uma juíza gaúcha absolveu um criminoso que atirou na cabeça de um policial durante uma operação, alegando "crime de resistência" em vez de tentativa de homicídio. Para a magistrada, disparar projéteis na cabeça de um agente não revela "intenção de matar". O policial permanece com sequelas neurológicas permanentes, mas isso é apenas um detalhe técnico na abstração jurídica.
Em outro caso igualmente emblemático, uma juíza libertou chefe de facção condenado a 70 anos, alegando "superlotação carcerária". O traficante comandava sua organização criminosa de dentro de um presídio de alta segurança e articulou o assassinato de um médico. Mas que volte para casa — afinal, humanidade judicial tem prioridade sobre segurança pública.
O economista austríaco Ludwig von Mises observou que a burocracia perde contato com as condições reais de vida. Essa análise aplica-se perfeitamente à magistratura brasileira contemporânea.
Quando um juiz nunca pisou numa favela, nunca usou transporte público, nunca teve que escolher entre pagar remédio ou conta de luz, como pode compreender as implicações reais de soltar um criminoso com 86 passagens? A resposta é cristalina: não pode e não quer.
Essa desconexão não é acidental — é estrutural. O sistema criou uma casta judicial hermeticamente isolada das consequências de suas próprias decisões. É como conceder poder de vida e morte a quem jamais enfrentará as repercussões de suas escolhas.
O fenômeno do "prende e solta" deixou de ser exceção para virar política de estado. Patrick e milhares como ele circulam livremente pelas ruas brasileiras graças a interpretações "humanitárias" da lei, que sistematicamente ignoram o direito básico à segurança dos cidadãos honestos.
A ausência total de responsabilização completa esse quadro distópico. Quando um magistrado liberta um criminoso perigoso que volta a delinquir, quais são as consequências para o juiz? Nenhuma. O sistema criou uma blindagem de irresponsabilidade absoluta: todos os privilégios do poder, nenhum dos ônus das decisões.
Essa impunidade institucional se alimenta de uma arrogância financeira sem paralelo. Quando questionado sobre os R$ 116 bilhões anuais que o judiciário custa aos cofres públicos — equivalente a 1,6% do PIB brasileiro — o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, responde com o cinismo típico da casta: a atuação do Judiciário tem "valor inestimável" porque há "coisas que têm valor, mas não têm preço". É a resposta perfeita de quem nunca pagou uma conta na vida: quando o dinheiro é dos outros, tudo fica "inestimável".
A desconexão atinge níveis cômicos quando descobrimos que 73,9% dos juízes acham que ganham pouco, mesmo com subsídios de pelo menos R$ 33 mil mensais. Uma juíza da Bahia chegou ao ponto de afirmar que a categoria está "empobrecida" e na "penúria" — isso enquanto recebem em média o dobro do teto constitucional. É literalmente a definição de "problemas de rico": quando sua definição de pobreza é ganhar apenas 15 vezes mais que um salário mínimo.
Aqui está o ponto crucial: uma casta que se considera "empobrecida", ganhando R$ 35 mil por mês, jamais compreenderá o drama de famílias que sobrevivem com R$ 1.400. Como podem julgar com sensatez, crimes motivados pela miséria real, quando sua própria noção de "penúria" seria riqueza inimaginável para 90% dos brasileiros?
Imagine o absurdo: um engenheiro responde civilmente se uma ponte cai, um médico responde por erro cirúrgico, um piloto responde por acidente aéreo. Mas um juiz que solta sistematicamente criminosos violentos? Esse permanece intocável, protegido pela sacralidade da "independência judicial".
Essa irresponsabilidade institucionalizada criou um ambiente de experimentação social às custas da segurança pública. Magistrados testam teorias criminológicas progressistas usando a população como cobaia, seguros de que jamais pagarão o preço de suas hipóteses equivocadas.
A hipocrisia do sistema revela-se na diferença gritante entre teoria e prática. Os mesmos juízes que pregam "ressocialização" para criminosos violentos exigem segurança máxima para si próprios: gabinetes blindados, escoltas armadas, residências fortificadas. Enquanto teorizam sobre "humanização do sistema penal" para o povo, vivem com mais proteção que dignitários internacionais.
É reconfortante defender direitos dos criminosos quando se tem uma barreira de segurança armada entre você e eles.
O juiz Casara provavelmente nunca foi vítima de crime violento. A magistrada que absolveu o agressor do policial jamais teve familiar baleado. Para essa elite, criminalidade é tema de seminário acadêmico, não trauma familiar. Discutem violência urbana do mesmo modo que debatem literatura francesa: com distanciamento intelectual completo.
Para o resto dos brasileiros, é questão de sobrevivência cotidiana.
Mais perverso ainda é como essa casta sequestrou o discurso dos direitos humanos para blindar-se de críticas. Questionar decisões lenientes com o crime vira "discurso de ódio". Exigir responsabilização judicial vira "ameaça à democracia". Criticar privilégios da magistratura vira "autoritarismo".
Mas a raiz do problema é mais profunda que o simples corporativismo. O sistema judicial ilustra perfeitamente uma contradição fundamental: magistrados são funcionários do mesmo estado que financia suas regalias, paga seus salários e garante seus privilégios. Como esperar imparcialidade de quem deve lealdade institucional ao próprio poder que deveria controlar?
A perversão é sistêmica: enquanto no mercado livre um árbitro privado seria demitido por decisões absurdas — perderia clientes e credibilidade —, juízes estatais são blindados de consequências. Não importa quantos criminosos soltem, quantos inocentes prendam ou quão desconectadas sejam suas sentenças. O estado garante seu salário, suas férias e sua aposentadoria integral, independente de performance ou resultados.
É a diferença entre responsabilização real e sinecura burocrática protegida pelo monopólio estatal da justiça.
Criaram um sistema onde criminosos têm mais direitos que vítimas, onde reincidência é tratada como acaso estatístico, onde magistrados são mais protegidos que suas próprias sentenças. É a inversão completa do princípio da justiça: quem deveria proteger a sociedade virou protetor de quem a agride.
Essa inversão não é acidental — é a consequência natural do monopólio estatal da justiça. O cidadão brasileiro não pode escolher outro tribunal, outro juiz, outro sistema. Está refém de uma magistratura que sabe ser insubstituível e age como tal.
A lógica é simples e perversa: reconhecer que o sistema está falido significaria admitir que décadas de decisões "progressistas" criaram o caos urbano atual. E isso é uma verdade que nossa aristocracia judicial recusa-se categoricamente a enfrentar, protegida que está pela blindagem do poder estatal.
A solução é evidente, ainda que politicamente incômoda: magistrados precisam ser responsabilizados pelas consequências de suas decisões. Juiz que sistematicamente liberta reincidentes violentos deveria responder quando estes cometem novos crimes. Magistrados que vivem isolados da realidade social não deveriam legislar sobre segurança pública.
Não existe almoço grátis — sempre alguém paga a conta. No sistema judicial brasileiro, criminosos são liberados gratuitamente e a sociedade paga o preço. Juízes tomam decisões sem custos pessoais e cidadãos comuns arcam com as consequências.
Essa equação perversa só mudará quando quem decide sobre criminalidade também conviver com os resultados de suas escolhas. Quando magistrados morarem nos mesmos bairros que suas vítimas potenciais, quando usarem o mesmo transporte público que o resto da população, quando seus filhos estudarem nas mesmas escolas públicas afetadas pela violência urbana.
Patrick Rocha Maciel completará 21 anos em liberdade, com 86 passagens na ficha e mais uma chance de criar novas vítimas. Suas próximas vítimas pagarão o preço da "humanidade" do juiz Casara — que dormirá tranquilo em sua residência segura, protegido pelas mesmas forças policiais que desautoriza com suas sentenças.
Porque justiça verdadeira exigiria que quem decide sobre segurança pública também viva com as consequências dessas decisões. E isso, definitivamente, é mais responsabilização do que nossa casta judicial está disposta a aceitar.
Enquanto os juízes permanecerem em suas torres de marfim, blindados de consequências e imunes à realidade, continuaremos sendo governados por uma elite que legisla sobre um mundo que nunca conheceu — e faz questão de nunca conhecer.
https://obrasildecima.com.br/juiz-esposo-de-marcia-tiburi-solta-bandido-com-86-passagens-pela-policia/
https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/juiza-solta-criminoso-que-baleou-policial-na-cabeca-nao-teve-intencao-de-matar/
https://www.gazetadopovo.com.br/republica/juiza-solta-chefe-faccao-condenado-alegando-falta-vagas-prisao/
https://www.cnj.jus.br/artigo-quanto-vale-o-judiciario/
https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/juiza-bahia-categoria-empobrecida-penuria/