Sem o estado, quem vai garantir que criminosos tenham acesso a armas e metralhadoras de grosso calibre?
Essa história pode até parecer piada, mas não é. É apenas o Brasil mesmo. Cerca de 21 armas de grosso calibre foram furtadas de um quartel das Forças Armadas, localizado na cidade de Barueri, no estado de São Paulo. Os superiores deram falta dos armamentos no último dia 10, mas não se sabe exatamente quando eles sumiram de fato. As armas haviam sido anteriormente enviadas para a manutenção e, depois, foram extraviadas. Acredita-se que as metralhadoras e os rifles foram furtados de dentro do quartel, eventualmente pelos próprios militares.
O Comando Militar do Sudeste afirmou que está realizando um inquérito policial militar para apurar o desaparecimento. Já o Exército informou que está tomando todas as medidas cabíveis para apurar o furto em questão. Das 21 armas furtadas, 13 são metralhadoras de calibre 50. As outras 8 armas roubadas são fuzis de 7,62mm. As metralhadoras .50 chamam mais a atenção nesse caso, dado o seu alto poder de fogo. Afinal, sua munição é capaz de perfurar blindagens, e a metralhadora consegue disparar até 550 tiros por minuto. No mercado negro, inclusive, uma arma desse calibre chega a ter um valor de R$ 200 mil.
No momento, quase 500 militares estão aquartelados, enquanto se investiga o furto. De acordo com o Comando Militar, “os militares estão sendo ouvidos para que possamos identificar dados relevantes para a investigação”. Até o momento, contudo, nem o Exército, nem a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo possuem informações mais precisas sobre o caso. Porém, todo mundo já sabe o que aconteceu: essas armas, muito provavelmente, foram parar nas mãos de bandidos que possuem muita grana para se armar.
A verdade é que criminosos já dispõem de armas desses calibres há um bom tempo. Em 2016, por exemplo, o PCC - facção que possui um diálogo cabuloso com certo partido político brasileiro - executou um rival na fronteira com o Paraguai, usando uma metralhadora .50. Eu sei, isso parece um pouco exagerado. Porém, os bandidos tipicamente usam esse armamento para assaltar bancos e carros-fortes mesmo.
Já o fuzil automático leve 762 tem sido a arma padrão do exército brasileiro desde a década de 1960, e é a típica arma que os bandidos usariam para confrontos com rivais e com a polícia. A partir de 2017, o FAL 762 passou a ser substituído, no exército, por fuzis de calibre 5,56mm. Então, você pode ter certeza de que, muito em breve, essas novas armas também estarão nas mãos dos criminosos.
Esse caso é, de várias formas, revoltante; mas ele também chama a atenção para a hipocrisia dos políticos, especialmente para a dos petistas que estão no poder. Afinal de contas, o Ministro da Justiça e Segurança Pública do governo PT, Flávio Dino, afirmou, meses atrás, que os CACs estavam armando as facções criminosas. A grande mídia embarcou nessa narrativa, afirmando que o crime organizado está bem armado por conta de armas legalizadas. Pois é, aí está mais uma prova de que essa narrativa é não apenas mentirosa - ela também é canalha, porque tira o foco do verdadeiro problema.
A verdade é que o estado é o grande responsável pelo armamento de facções criminosas - no Brasil e em outras partes do mundo. Para o cidadão comum, é impossível dispor de armas que são capazes de perfurar a blindagem de um pequeno tanque de guerra e de derrubar aviões. Porém, em qualquer favela brasileira, você pode encontrar armas desse tipo nas mãos de bandidos. E o principal de tudo: sem registro, sem verificação, sem rastreamento. E adivinha qual é a origem dessas armas? Pois é.
Trata-se de uma questão de incentivos. As forças armadas e o aparato policial dispõem de armamento para, supostamente, garantir a segurança da população. Acontece que os militares não precisam pagar para ter essas armas à sua disposição; e elas valem uma grana preta no mercado negro. Veja, então, que existe aí um perverso, mas muito lucrativo incentivo: o risco envolvido no furto de armas é baixo, a punição é branda, mas o benefício é alto. Conforme citado, algumas dessas armas furtadas chegam a valer R$ 200 mil no mercado paralelo. Isso é muito mais do que ganha um general de 4 estrelas - e, melhor ainda, sem sofrer retenção de imposto de renda!
Porém, a culpa do estado vai muito além desses incentivos perversos. O estado treina sujeitos em táticas de guerra e no manuseio de diversos armamentos. No futuro, contudo, muitos desses deixarão as polícias e o exército para formar milícias e facções criminosas. Esse é, inclusive, um fenômeno que acontece no Brasil há muito tempo, e de formas muito variadas.
Já em 2002, eram conhecidas as notícias de que pelo menos 15 ex-militares da Brigada Paraquedista do Exército davam treinamento para traficantes no Rio de Janeiro. Esses cursos particulares chegavam a custar R$ 8 mil a aula - e isso em valores daquela época! Em outras palavras: o estado treina indivíduos que usarão seu conhecimento para formar facções criminosas que trarão toda sorte de prejuízos à sociedade. Mas a função do estado não era, justamente, garantir segurança para a população?
Só que existe ainda uma culpa maior do estado na questão da criminalidade. Os grandes grupos criminosos que hoje atormentam a sociedade brasileira devem sua existência ao estado. Foram as medidas de proibição do comércio de drogas e de outras atividades que acabaram por criar um mercado paralelo, dominado por sujeitos violentos e que mantêm seu poder usando meios cada vez mais cruéis. Conforme o estado foi apertando o cerco contra essas atividades, mais violentas se tornaram as facções criminosas. Ironia das ironias, como vemos, é o próprio estado que se encarrega de dar a esses bandidos as armas pesadas para que essa inútil guerra continue sendo travada.
E é por isso, inclusive, que esses grupos criminosos se espalham dentro das instituições estatais. A coisa vai além do suborno e das propinas: grupos como o PCC são conhecidos por infiltrar seus aliados em cargos públicos, especialmente no Poder Judiciário. Na prática, essa é uma perversão do sistema estatal, feita por um grupo criminoso que deve sua existência e sua manutenção, em primeiro lugar, ao próprio estado!
Aliás, existe ainda um fator ideológico por trás do surgimento de facções criminosas no Brasil - e que explica o fato de que esses grupos conseguem ter um “diálogo cabuloso” com governantes brasileiros. Você pode conferir um pouco dessa questão ideológica em nosso vídeo: “PCC planejou explodir Bolsa de SP para lutar contra o capitalismo” - link na descrição.
É claro que alguém, agora, poderia se perguntar: mas esse tipo de coisa não aconteceria em uma sociedade plenamente livre? Funcionários de exércitos privados não poderiam se corromper e contrabandear armas de grosso calibre para bandidos? Sim, isso poderia acontecer, mas as empresas privadas teriam todos os incentivos para mitigar esse risco. Afinal de contas, uma empresa de segurança privada que é incapaz de proteger suas próprias armas, não vai ser contratada por ninguém, e vai ser eliminada do mercado.
Já o exército estatal brasileiro… bem, ele é um monopólio, e vai continuar existindo, com ou sem crimes, com ou sem eficiência. Os responsáveis, conforme já citado, receberão punições brandas. Além disso, furtos menores acontecem a todo momento, e costumam não dar em nada. A verdade é que o estado é uma máquina de ineficiência e de má gestão, por conta de seus incentivos perversos, e de seu monopólio forçado.
Infelizmente, o mesmo estado que, supostamente, tem a função de proteger a população de grupos criminosos, permitiu que 2 dezenas de armas de altíssimo poder de fogo fossem entregues aos bandidos mais perigosos do país. Dada a repercussão do caso, pode ser que, desta vez, o estado consiga reaver os armamentos e os responsáveis sejam punidos. Mas essa é a ponta do iceberg, uma gota no oceano da ineficiência estatal.
Enfim, é provável, infelizmente, que os membros do estado continuem fornecendo armas para bandidos, enquanto dificultam ainda mais a autodefesa da população. Esse é um fenômeno que está em curso há décadas, e que só tende a piorar. Afinal de contas, o estado é, ele próprio, uma máfia criminosa, um ente ilegítimo. É mais do que natural, portanto, que ele se alie não aos cidadãos de bem, mas aos bandidos mais perigosos que existem. Por conta dessa relação promíscua entre estado e facções, pode ser que, mais do que nunca, o crime organizado brasileiro seja capaz de promover uma guerra urbana ainda mais violenta e cruel.
https://www.metropoles.com/sao-paulo/pcc-usou-arma-identica-a-furtada-do-exercito-em-execucao-na-fronteira
https://www1.folha.uol.com.br/folha/dimenstein/imprescindivel/semana/gd040202a100202.htm
https://www.youtube.com/watch?v=edCOIzn5Kec (vídeo citado)