A nova fase da Operação Sem Desconto prendeu ex-dirigentes do INSS e um ex-ministro por envolvimento em um esquema de fraudes e desvios. O escândalo mostra como o estado, longe de proteger, é na verdade o principal predador dos mais vulneráveis.
Na manhã de 13 de novembro de 2025, a Polícia Federal (PF), em parceria com a Controladoria‑Geral da União (CGU), deflagrou mais uma fase da denominada operação “Sem Desconto”, destinada a investigar um esquema massivo de fraudes no INSS. Foram cumpridos 63 mandados de busca e apreensão, 10 mandados de prisão preventiva e ainda diversas medidas cautelares em ao menos 15 unidades da federação — incluindo os estados do Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe, Tocantins e no Distrito Federal. Segundo as investigações, entidades associativas firmavam Acordos de Cooperação Técnica (ACTs) com o INSS para que fosse autorizado — ou dado como autorizado — o desconto automático de mensalidades dos benefícios de aposentados e pensionistas. Ocorre que, de acordo com auditoria da CGU, cerca de 97 % dos entrevistados afirmaram não ter autorizado esses descontos.
Entre os alvos da operação encontram-se o então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, o ex-ministro da Previdência José Carlos Oliveira, empresários, lobistas, servidores públicos e entidades associativas. A investigação apura crimes como constituição de organização criminosa, estelionato previdenciário, corrupção ativa e passiva, além de ocultação e dilapidação de patrimônio. Também consta que o esquema pode estar ligado ao crime organizado — o que revela não apenas uma falha pontual, mas um conluio entre o estado e outras organizações criminosas.
A CPMI que investiga o caso identificou indícios de assinaturas forjadas, entidades que não entregavam documentação ao INSS, saltos abruptos nos valores descontados e negligência grave dos mecanismos de controle internos do órgão. Mesmo com alertas internos da CGU desde ao menos 2023, nenhuma ação decisiva foi tomada para interromper ou bloquear os convênios suspeitos, o que permitiu que o esquema se ampliasse.
A investigação da PF e CGU já cumpriu centenas de mandados, incluindo mandados de busca, apreensão, sequestro de bens superiores a R$ 1 bilhão, prisões e afastamentos de servidores públicos. Há relatório da CGU de que, mesmo após alertas internos, o INSS autorizou que entidades continuassem a operar descontos em massa, em muitos casos sem verificar biometria, ou exigindo comprovantes mínimos. As entidades associativas, por sua vez, cresceram vertiginosamente em filiados e arrecadação — em muitos casos sem comprovação de que prestavam serviços reais aos beneficiários.
Durante audiências na CPMI, ficou registrado que o ex-presidente do INSS admitiu que sabia da sensibilidade do tema e, no entanto, não implementou bloqueios cautelares ou suspensões dos convênios até que a operação fosse deflagrada. A discrepância entre o volume de descontos e a fiscalização permitida aponta para um grau de omissão ou conivência que vai além de mero erro administrativo.
Se um rombo de R$ 6,3 bilhões foi permitido entre 2019 e 2024, atravessando governos distintos, isso significa que tanto o estado quanto o partido no poder falharam sistematicamente. A promessa de proteção ao vulnerável — de que “o papai estado” irá cuidar dos cidadãos vulneráveis — revela-se vã. A operação envolveu o próprio presidente do INSS, servidores de alto escalão, lobistas e deputados — e ainda assim os mecanismos estatais de controle falharam ou foram coniventes. Isso evidencia a realidade de que o aparelho estatal está voltado à reprodução de privilégios e vantagens corporativas, e não à efetiva defesa dos interesses do cidadão.
O que está em xeque é um sistema em que o órgão central — o INSS — se responsabiliza pela previdência e aposentadoria de milhões de brasileiros. Não há opção de recusar participar do esquema, que atua em conluio com outras associações e entidades que dizem "proteger" o cidadão. Esse arranjo tornou possível que milhões de aposentados e pensionistas fossem sujeitos a descontos mensais que jamais autorizaram e, em muitos casos, desconheciam. E mesmo quando os alertas vieram, a atuação estatal foi caracterizada pela morosidade e negligência.
Do ponto de vista filosófico e prático, através de uma análise libertária, este episódio oferece uma série de lições que apontam para a necessidade de repensar radicalmente a forma como organizamos previdência, segurança financeira e proteção social numa sociedade livre. Um sistema estatal de previdência carrega, de modo intrínseco, incentivos à ineficiência, à falta de transparência e à captura de grupos de interesse. Quando um órgão estatal detém o poder de descontar automaticamente benefícios, autorizar entidades conveniadas, firmar convênios com pouco escrutínio e fiscalizar mal, abre-se o caminho para abusos sistêmicos. Como se viu, mesmo um órgão que, na teoria, deveria proteger os mais vulneráveis, torna-se, dentro deste sistema, palco de exploração desses mesmos grupos vulneráveis.
Além disso, a dependência da população aposentada — e de fato de todo aquele que acredita que o estado fornece a previdência como um “direito adquirido” — gera uma erosão da responsabilidade individual e da escolha consciente. Se o indivíduo não escolhe explicitamente como poupar ou investir, e se confia em promessas estatais que se revelam frágeis, então sua autonomia e propriedade ficam vulneráveis. Esse episódio mostra que confiar em “segurança estatal” é um grande risco, sobretudo quando se revela que benefícios podem ser reduzidos ou desviados sem consentimento. A filosofia libertária sustenta que os indivíduos deveriam ter plena autonomia para decidir como poupar, investir e assegurar seu próprio futuro, em vez de depender de promessas estatais que se revelaram frágeis. O fato de beneficiários terem descontos não autorizados é, antes de tudo, uma violação de sua propriedade.
Também cabe uma crítica ao papel dos intermediários — associações, sindicatos, entidades conveniadas ao INSS — que atuaram através de conluio com o estado para roubar os aposentados. Em ambientes onde o estado concede privilégios, desconto em folha, acesso a benefícios, e não exige transparência ou competição, fica fácil para qualquer mal-intencionado se aproveitar das vulnerabilidades no sistema. O modelo libertário defende que entidades operem estritamente conforme contrato voluntário. Já no modelo estatal, vimos entidades que sequer entregavam documentação completa, que se filiaram a beneficiários sem consentimento, ou que forjaram assinaturas, e o INSS continuou os convênios mesmo com alertas.
Certo, mas tudo isso se aplica mais em uma esfera preventiva. Mas o que poderia ser feito depois que a fraude já foi concretizada? É neste ponto que a questão da responsabilização surge como calcanhar de Aquiles do modelo estatal: embora existam prisões e investigações, o aparato estatal dilui responsabilidades, atrasa punições e permite que dirigentes e gestores continuem atuando enquanto o processo tramita. Num sistema privado, gestores seriam substituíveis, contratos passíveis de terminação imediata, falhas teriam custos diretos aos proprietários ou acionistas — o que geraria maior disciplina e consequências a quem, por má fé ou incompetência, causa dano ao patrimônio alheio.
Há ainda a questão de que as medidas tomadas pelo governo representam mais paliativos do que mudanças estruturais. A CPMI realizou convocações, investigações e relatórios, mas o modelo continua em vigor: as entidades conveniadas continuam existindo, o aparato estatal continua gerindo descontos automáticos em folha pelo INSS — ou seja, o mecanismo permanece. Portanto, enquanto não se desmontar o monopólio estatal e promover modelos alternativos, outro escândalo semelhante emergirá, sendo para isso apenas questão de tempo.
Deste modo, não se trata apenas de corrigir “falhas pontuais” ou “casos isolados”. O escândalo revela que o sistema inteiro está estruturado de modo a permitir tais abusos — uma engrenagem onde estado, entidades conveniadas, servidores públicos, lobistas, políticos e beneficiários se mesclam em uma teia de privilégios e extrações. O libertarianismo demonstra que tentar “arrumar” esse modelo por dentro — via mais controle, regulação e auditorias — apenas ataca sintomas. É preciso questionar o fundamento: por que o estado deveria deter o monopólio da previdência, obrigar contribuições, gerir benefícios sem concorrência e permitir intermediários com privilégios?
A reação libertária a esse escândalo é clara: o modelo de previdência estatal está condenado a falhar, primeiro por razões lógicas (ausência de mercado, concorrência, feedback, responsabilidade individual) e segundo porque abre espaço a fraudes em larga escala como a que atingiu os aposentados brasileiros. O que ocorreu foi uma tragédia onde pessoas que trabalharam anos, contribuíram para o sistema acreditando em sua justiça, foram vítimas de apropriação indevida de suas economias. A ideia libertária de que cada um deve responder por sua própria vida financeira e que os contratos devem ser transparentes e voluntários, portanto, se mostra não apenas filosofia abstrata, mas uma necessidade prática e urgente.
Em conclusão, este episódio evidencia que confiar em um estado-monopólio para gerir a segurança financeira dos cidadãos pode sair caro — para os que pagam, para os que esperavam receber e para a sociedade como um todo. A liberdade individual, a responsabilidade, a propriedade privada e a escolha voluntária são os pilares que se erguem como alternativa real a um modelo que mais uma vez falhou no seu propósito "oficial", mas teve sucesso em seu propósito real: extorquir o cidadão trabalhador para sustentar uma elite de parasitas e burocratas que não produzem nem contribuem com nada de valor para a sociedade.
A lição que emerge desse escândalo é que não há corrupção isolada em estruturas baseadas na coerção. É o próprio desenho institucional do estado que cria a possibilidade da fraude e a impunidade de seus agentes. Por isso, quanto mais poder se concede a essas instituições, mais inevitável se torna o abuso.
O verdadeiro caminho de reforma, portanto, não está em criar novas “camadas de controle”, nem se contentar em prender alguns agentes, mas em retirar o poder do controle central. Somente quando o indivíduo puder dizer “não” ao estado — e escolher alternativas melhores — é que a corrupção deixará de ser regra e passará a ser exceção. A mensagem é clara: não podemos continuar depositando nossa confiança na centralização estatal da previdência — é hora de construir institutos de proteção social baseados em liberdade, concorrência e responsabilização real.
https://www.gazetadopovo.com.br/economia/desvio-6-3-bilhoes-inss-ligado-crime-organizado/
https://www.reuters.com/fact-check/portugues/FVKOQGDKQRPYXIWREDDRNJKOUM-2025-05-09/
https://www.brasilparalelo.com.br/noticias/escandalo-do-inss-o-que-a-cpmi-ja-descobriu-sobre-os-desvios?
https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaoaudiencia?id=35505
https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2025-09/pf-deflagra-nova-fase-de-operacao-que-apura-fraudes-no-inss
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2025/08/28/em-depoimento-fechado-delegado-falou-durante-cinco-horas-na-cpmi-do-inss
https://www.camara.leg.br/noticias/1195997-cpmi-do-inss-ouve-controladoria-da-uniao-sobre-fraudes-em-aposentadorias/